“Vamos deixar o período de cicatrização começar”. Esta mensagem foi passada por Boris Johnson após a retumbante vitória na eleição do dia 13 último que o consagrou como primeiro ministro e lhe deu a maioria absoluta no Parlamento. Isto porque, depois de tantas idas e vindas, o processo de separação do Reino Unido da União Europeia começou realmente a acontecer. Para desgraça dos que não queriam a separação, não houve mais como reverter a decisão que fora tomada em plebiscito em 2016. O dia 31 de janeiro é a data para a entrega a Bruxelas do acordo para a saída.
Muitas etapas terão que ser cumpridas ainda, a começar pelo período de transição, que tem prazo até dezembro de 2020. Até lá muitas e difíceis etapas terão que ser superadas, com negociações para: um acordo comercial com a UE; para manter a paz na Irlanda do Norte; para evitar a fuga de empresas e de corporações financeiras; para recuperar a infraestrutura e para bloquear o movimento separatista na Escócia. Como se observa, não são poucas as cicatrizações que precisam acontecer.
Porém, se do lado britânico é necessário fazer este tratamento, não será muito diferente do lado europeu. A saída do Reino Unido é uma grande defecção para a UE. O grupo perde um de seus atores mais importantes. É sempre importante lembrar que a União Européia foi constituída para sufocar os nacionalistas exacerbados que levaram o continente a duas grandes guerras, com milhões de mortos e destruição generalizada. A Inglaterra teve um peso decisivo na guerra vencida pelos aliados e na formação da comunidade européia, um projeto que teve a pilotá-lo a França e a Alemanha, justamente dos dois grandes opositores na conflagração mundial.
Os europeus se deram conta de que o nacionalismo deveria ser substituído pelo ideal de uma Europa unificada, como uma única e grande nação. E assim, após o Tratado de Roma, de 1957, foram se aglutinando e juntando cada vez mais membros. Um grande salto deu-se após o término da União Soviética, em 1991, quando o grupo passou a ser integrado por 27 países, tendo uma única moeda. Porém, a crise financeira de 2008 e a dos refugiados da segunda metade desta década se constituíram em duros golpes para a unificação. Trouxeram de volta o sentimento nacionalista, reforçado em países como Alemanha e França, mas, decisivo na votação dos ingleses. E agora a Europa precisa cuidar para que a “moléstia” que abateu o Reino Unido não tenha metástase em seu território.